sexta-feira, 1 de junho de 2007

Protocolo da 13ª sessão

Participantes:

Prof. Doutor Mendo Castro Henriques

André Luís Gomes Martins

António Fernando Teixeira Cardoso

Bruno José Martins Domingos

Edgar Paulo Cadir

Fernando Manuel Marques Apolinário

Francisco Manuel Narciso

João Paulo Machado de Freitas

Martiniano Pedro Moutinho Rato

Paulo Alexandre Alves

Quintino Martins Trinchete

Ruben Dario Romero Ribeiro

A sessão iniciou-se com a leitura, discussão e correcção do protocolo relativo à sessão anterior. De seguida procedeu-se à continuação da leitura e análise do Epílogo da obra Insight de Bernard Lonergan.

Na parte que foi lida, Lonergan aborda qual pode ser o impacto da sua obra na teologia. Apesar de ser um teólogo, a obra Insight é escrita segundo a perspectiva do filósofo, sendo portanto uma obra de filosofia. Mas não é uma obra de filosofia que se isola num domínio concreto, como se construísse um sistema filosófico, mas sim uma obra que aborda aquilo que é o entendimento humano (daí o subtítulo).

Neste aspecto, Lonergan aponta três pontos principais sobre os quais a sua obra oferece contributos importantes:

1º ponto: A filosofia de Lonergan abre espaço para uma interpretação do dogma que não cai nos excessos dos fideístas que negam qualquer racionalidade na fé e que o acusam de ser frio, desprovido de caridade, nem nas críticas dos racionalistas que o acusam de ser irracional e infundamentado. Resta acrescentar que as criticas dos fideístas são muitas vezes causadas pelas contra-posições dos filósofos, como por exemplo Descartes, que fazem apelo a conceitos que são contra a experiência humana, como fazer depender a existência do pensamento humano: “Eu penso, logo existo”.

2º ponto: Em teologia, como no resto das ciências humanas, saber colocar correctamente um problema elimina per si uma série de falsas questões. É este um dos pontos que conduz a uma grande dificuldade na matemática: à preguiça que leva à pouca destreza dos alunos no cálculo junta-se a falta de eficácia em equacionar (colocar em equações) um problema. Neste domínio os povos orientais, como por exemplo a China e a Índia, têm um maior avanço, sendo a estes e não aos árabes, como muitas vezes se julga, que se deve atribuir muitos dos grandes avanços matemáticos, como, por exemplo, a “invenção” do número zero.

3º ponto: Há que saber colocar correctamente o lugar do mistério e, portanto, da própria fé. Já no concílio Vaticano I (1869-1870), se afirma que a fé é superior à razão (sessão III), embora não se negue que ambas são úteis para o conhecimento humano. Nas próprias palavras do concilio: “O sentimento perpétuo da Igreja católica defendeu também e defende que existe uma dupla ordem do conhecimento, distinta não só segundo o princípio mas também pelo seu objecto. Pelo seu principio, em primeiro lugar, porque numa conhecemos através da razão natural e na outra pela fé divina. Pelo seu objecto também porque, para além daquelas coisas que a razão natural pode alcançar, são-nos propostos para acreditarmos mistérios escondidos em Deus que, se não fossem divinamente revelados, não poderiam ser conhecidos” (DS §3015). Um dos reflexos desta relação fé-razão é o facto de, a partir daí, se começar a dar relevância ao estudo do texto bíblico para além da significação literal do mesmo, olhando, entre outras coisas, para o contexto em que o texto foi produzido.

De seguida, Lonergan faz uma importante distinção entre ser proporcionado e ser sobrenatural. Há aqui que fazer uma ressalva sobre o uso desta palavra, uma vez que o uso que Lonergan lhe dá foi caindo em desuso. Considerar que existe uma realidade que está para além da natureza é hoje uma distinção que não se utiliza. Ainda assim, o ser proporcionado à nossa consciência é abordado detalhadamente por Lonergan nos capítulos I – XVIII, ao passo que o ser não proporcionado (sobrenatural) é abordado nos dois últimos, sobre o nome de “Conhecimento Transcendental Geral” (General Transcendent Knowledge) e “Conhecimento Transcendental Especial” (Special Transcendent Knowledge). Um ponto que Lonergan frisa é que, dada esta distinção, o teólogo não necessita de explicar realidades de outros mundos para explicar a realidade do seu mundo. O teólogo não pode nunca reduzir as realidades da fé às do ser proporcionado. Explicar as realidades sobrenaturais como a Encarnação, a morada do Espírito Santo e a Visão Beatífica recorrendo a conceitos metafísicos proporcionados, sem manter a devida distinção e distanciação é um erro.

Como sabemos, Lonergan termina a obra Insight em 1957, antes da convocação do concílio Vaticano II (1959) e do seu período preparatório (1960). Podemos considerar que Lonergan é um dos teólogos que antecipa as ideias do Vaticano II, e dizer até que ele é o Filósofo do Vaticano II.

Foi ainda acrescentado, no final da sessão, que, ao longo do século XIX e XX, no esplendor da modernidade, a religião foi considerada irracional pelo senso comum, e a fé como sendo do âmbito do subjectivo e do pessoal. No entanto, antes da modernidade, até ao século XVII, pelo contrário, o facto da religião ser considerada como absoluta e até como indivisivel, provocou querelas e guerras religiosas. Desta forma, devemos considerar que, uma coisa é a doutrina da Igreja, que sempre proclamou a ligação entre fé e razão e outra coisa é o impacto social desta ligação, que varia com o ambiente cultural de cada época. Lonergan defende que todo o conhecimento humano se articula com a fé, não tendo por isso uma posição apologética. Termino com uma citação da encíclica Fides et Ratio de João Paulo II: “Uma filosofia que se desenvolve de harmonia com a fé, aceitando o estímulo das exigências teológicas, faz parte daquela «evangelização da cultura» que Paulo VI propôs como um dos objectivos fundamentais da evangelização. Pensando na Nova Evangelização, cuja urgência não me canso de recordar, faço apelo aos filósofos para que saibam aprofundar aquelas dimensões de verdade, bem e beleza, a que dá acesso a palavra de Deus” (Fides et Ratio §103).

Paulo Alexandre Alves

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